terça-feira, 20 de novembro de 2012

O requisito do "Periculum in Mora" na Tutela Cautelar




As providências cautelares visam impedir que, durante a pendência de qualquer acção, ocorram prejuízos ou que a situação de facto se altere de modo a que a sentença nela proferida, sendo favorável, perca toda a sua eficácia e utilidade ou parte delas -  “periculum in mora” (o prejuízo, o perigo da demora inevitável do processo), como decorre do Art. 112º/1 do CPTA.
As características das Providências Cautelares são a Instrumentalidade, a provisoriedade e a sumariedade. A primeira traduz a dependência na função e não só da estrutura, de uma acção principal como decorre do art. 113º/1 do CPTA, relativamente à segunda, significa que não está em causa a resolução de um litígio a título definitivo (sendo susceptível a alterações: art. 124º CPTA), por ultimo e quanto à sumaridade, o que está em causa é a procedência de meras apreciações perfunctórias, baseadas num juízo sumário sobre os factos a apreciar, uma vez que a efectividade da tutela cautelar depende da celeridade dos tribunais em proporcioná-la em tempo útil, logo, as questões não poderão ser alvo de uma análise aprofundada.
A característica do Periculum in mora, a par do fumus boni iuris, á própria da característica da provisoriedade (art. 120º CPTA). Pergunta-se o que significa a expressão em latim, que literalmente significa “Perigo na demora”. Como será  fácil de depreender, pretende-se evitar o risco de acarretar prejuízo para o titular do interesse protegido decorrente da demora da composição final do litígio, através de uma composição provisória do litígio, que permite esperar por aquela; tendo como objecto um “fumus boni juris”, ou seja, a mera probabilidade séria de existência de um direito. Pretende-se assim evitar que a utilidade da sentença pode ser posta em causa, caso ocorra certo decurso de tempo, podendo tornar-se inútil, como dispõe expressamente as alíneas b) e c) do art. 120º do CPTA, quanto às providencias conservatórias (as quais o Professor Vieira de Andrade faz corresponder o Periculum in mora de infrutuosidade) que têm como fim principal, manter a situação existente, e às providências antecipatórias (as quais o mesmo Professor faz corresponder o Periculum in mora de retardamento) e que visam antecipar parcial ou totalmente a solução pretendida. (Miguel Prata Roque considera preferível designar as Providencias conservatórias de Providencias de conteúdo negativo e, de conteúdo positivo as providencias antecipatórias)
Pergunta-se então como se afere a existência de Periculum in mora: é necessário um juízo de certeza ou basta um juízo de mera verossemelhança?  Mario Aroso de Almeida, Miguel Prata Roque e Alberto dos Reis recusam a necessidade de um juízo de certeza, sendo que este chama a atenção para a incompatibilidade com o caracter provisório da Providência pondo até em causa a finalidade da sentença final, uma vez que a exigir-se um juízo de certeza, haveria como que uma antecipação de cognição sobre a pretensão formulada na acção judicial, própria da acção principal. Considera-se portanto, necessária apenas a demonstração de uma possibilidade de ocorrência de prejuízo para o recorrente ou de uma probabilidade de ocorrência de danos, não se encontrando preenchido o requisito do Periculum in mora, caso seja manifesta a impossibilidade de ocorrência de prejuízos decorrentes da demora do processo principal. A antecipação de tutela reduz naturalmente, a profundidade da cognição, condicionando-se a um juízo de verossimilhança qualificado, assim como o requisito do “Fumus boni iuris”.
Como se afere a lesão? Esta está directamente relacionada com a dimensão do prejuízo causado à efetividade da sentença final, não tem que ver com a grandeza do prejuízo económico (não pode ser recusada cautelar com o argumento que os prejuízos causados serão facilmente reparáveis) pelas conclusões do Acórdão nº 00913/04.0BEBRG de Tribunal Central Administrativo Norte, 10 de Março de 2005, o critério passou “a ser o da maior ou menor dificuldade que envolve o restabelecimento da situação que deveria existir se a conduta ilegal não tivesse tido lugar, já que o juiz deve ponderar as circunstâncias concretas do caso em função da utilidade da sentença e não decidir com base em critérios abstractos, sendo que, nessa ponderação, o juiz deve atender a todos os prejuízos relevantes para os interesses do requerente, quer o perigo respeite a interesses públicos, comunitários ou colectivos, quer estejam em causa apenas interesses individuais.”
O Juíz cautelar apenas deve ver preenchido a requisito do Periculum in Mora se não houver indícios manifestos de que a demora processual não provocaria uma impossibilidade integral ou parcial de execução da Sentença Final. Como acrescenta, o referido acórdão:
“Não tendo ficado provada qualquer situação concreta que de algum modo pudesse a vir a constituir uma situação de facto que inviabilizasse a utilidade da apreciação do litígio entre as partes na acção principal, nem tendo sido invocados quaisquer prejuízos decorrentes da execução da decisão em questão na esfera jurídica da requerente e cuja reparação fosse difícil de vir a concretizar-se não pode ter-se como verificado o requisito do "Periculum in mora" ”. Segundo os professores Viera de Andrade e Mário Aroso de Almeida, este juízo deverá ser um juízo de prognose, levado a cabo pelo julgador que, colocando-se na situação futura de uma hipotética sentença de provimento, conclui se há, ou não, razões para recear que tal sentença venha a ser inútil (por entretanto se ter consumado uma situação de facto incompatível com ela, ou por se terem produzido prejuízos de difícil reparação para quem dela deveria beneficiar, que obstam à reintegração específica da sua esfera jurídica). Acrescente-se que, por parte do requerente, deverá ver-se provado tal receio, muito embora não se exija, como já foi referido, um juízo de certeza sobre os factos que evidenciam, per si, o perigo que a acção principal perca o seu efeito útil, pela decorrência do tempo, até porque a demora processual pode dar origem a Responsabilidade Civil contra o Estado (art. 22º CRP) e é contra o caracter da própria Providencia Cautelar.





ALMEIDA, Mário Aroso de, Manual de Processo Administrativo, Almedina, 2012.

FONSECA, Isabel Celeste, Introdução ao Estudo Sistemático da Tutela Cautelar no Processo Administrativo, Almedina, 2002

ROQUE, Miguel Prata, «"Cautelas e Caldos de Galinha?" - Reflexões sobre a Reforma da Tutela Cautelar Administrativa», Novas e Velhas Andanças do Contencioso Administrativo - Estudos Sobre a Reforma do Processo Administrativo, Coordenação: Vasco Pereira da Silva, Almedina, 2005
 
ANDRADE, José Carlos Vieira de, Justiça Administrativa (Lições), 11ª edição, Almedina, 2011.



Teresa Fanico

aluna nº 19496
 

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